"Temos alguns problemas ainda em Portugal com o
'streaming'. Alguns problemas até bastante graves", porque "somos um
dos países da União Europeia que menos paga o 'streaming' de música, seja no
Spotify, seja no iTunes, seja em que plataforma for", disse David Fonseca
à Lusa.
O músico lembra que "as plataformas de 'streaming' só
produzem dinheiro para os artistas quando as pessoas pagam" e, em
Portugal, "as pessoas não valorizam a música da mesma forma como olham
para a assinatura de uma Netflix ou de outro meio de entretenimento",
exemplificou.
"Espero que vá aumentando em Portugal o número de
pessoas que, de facto, assinam para ouvir música, porque a indústria também
depende um bocadinho disto", mesmo que o 'streaming' pague "muito,
muito mal", sobretudo "aos grupos mais pequenos".
"Mas se as pessoas tivessem as subscrições desses
serviços, talvez esse processo fosse ligeiramente mais equilibrado",
sublinhou.
A celebrar 25 anos de carreira na música com a digressão
"Still'25", David Fonseca é testemunha privilegiada da revolução que
a indústria sofreu nas últimas décadas.
"Hoje é um processo todo ele muito mais rápido, às
vezes até rápido demais", defende.
Os serviços de 'streaming' fizeram "abrir as torneiras
[de música] de todos os sítios do mundo" e "isso faz com que toda a
indústria seja diferente", mas também "a forma como as pessoas
abordam a música e a importância que lhe dão".
Para David Fonseca a era digital tem mais vantagens do que
desvantagens, porque "há uma liberdade muito maior para que as pessoas
possam explorar como ouvintes o que quiserem ouvir e como criadores terem a
liberdade de pôr aí a sua música quando quiserem e de que forma o quiserem
fazer".
Quando começou a tocar, o mais importante "era vender
música, era vender discos". "O 'streaming' veio alterar totalmente
esse paradigma".
A facilidade com que hoje se grava e distribui a partir de
casa "é uma das partes positivas do avanço da tecnologia".
"Miúdos com acesso a um computador podem, de facto,
fazer um disco. Mesmo que não saibam as notas que estão a fazer. Acho isso uma
coisa incrível. Se aos 18 anos tivesse acesso a uma coisa dessas, eu tinha
ficado louco", admite.
São processos impensáveis há 25 anos, quando o músico
começou nos Silence 4, um tempo em que "não havia nem um décimo da oferta
que existe hoje" e tudo estava dependente das editoras.
"Mas também não sei se o tipo de sucesso que os Silence
4 tiveram seria replicável nos dias que correm", porque havia muita
seleção e "muito poucos [projeto] chegavam à gravação de discos".
A mudança foi substancial a todos os níveis e, para o
demonstrar, David Fonseca exemplifica com o contexto em que os Silence 4
gravaram no Reino Unido o segundo disco, "Only pain is real" (2000).
"Foi durante mês e meio num estúdio em Londres. Ora, isso seria
literalmente impossível nos dias que correm. Diria que esse orçamento daria
hoje para fazer pelo menos uns 20 discos. E isso acaba por alterar muito a
forma como a própria música se faz".
Para a banda de Leiria que ficou na história da música
nacional, "seria mais difícil ter um sucesso tão avassalador" na
atualidade.
"Os Silence 4 até poderiam ter sucesso, mas não da
forma como foi na altura - parecia que toda a gente ouvia aquela banda",
recorda.
Hoje, a realidade é "muito mais fragmentada", o
que é "mais positivo", porque "há oferta para todos, há espaço
para todos e não há uma ou duas bandas que dominam o mercado inteiro".
"Acho isso muito interessante, honestamente", concluiu.